26 maio 2016

A Alma Encantadora das Ruas

"— Admiraste aquele negociante ambulante?

— Admirei um refinado “vigarista”…

— Oh! meu amigo, a moral é uma questão de ponto de vista."



Sinopse: João do Rio (1881-1921, pseudônimo de Paulo Barreto) fez da crônica jornalística uma janela através da qual contemplava as glórias e as misérias do Brasil republicano. Em A alma encantadora das ruas, reunião de textos publicados na imprensa carioca entre 1904 e 1907, ele percorre as ruas do Rio de Janeiro para reter a cosmópolis num caleidoscópio. A cidade vivia um processo de transformação acelerada, passando de corte modorrenta a ambiciosa capital federal. Ela será o palco das perambulações de João do Rio, o dândi para quem o hábito de flanar definia um modo de ser e um estilo de vida. João do Rio saturava seus textos de reminiscências decadentistas, mas o olhar que fixava no presente era o de um observador que se abria para os tempos modernos.

"Eu amo a rua. Esse sentimento de natureza toda íntima não vos seria revelado por mim se não julgasse, e razões não tivesse para julgar, que este amor assim absoluto e assim exagerado é partilhado por todos vós (...) Tudo se transforma, tudo varia — o amor, o ódio, o egoísmo. Hoje é mais amargo o riso, mais dolorosa a ironia. Os séculos passam, deslizam, levando as coisas fúteis e os acontecimentos notáveis. Só persiste e fica, legado das gerações cada vez maior, o amor da rua."



       
João Paulo Alberto Coelho Barreto (1881-1921), jornalista, cronista, escritor, foi o pioneiro do jornalismo ao mesclar o texto jornalístico com o literário. Foi o primeiro na impressa brasileira a estabelecer os moldes da moderna reportagem. Com o hábito de ir às ruas e observar a diversidade de personagens, as contradições da modernidade, a desigualdade social e as transformações urbanas, retratou com realismo a sociedade da Belle Époque . Seu 3° e mais importante livro, A alma encantadora das ruas, é uma coletânea de reportagens e crônicas publicadas entre 1904 e 1907, dedicadas às ruas do Rio e seus personagens. João do Rio se tornou membro da Academia Brasileira de Letras em 1910, escreveu sobre o que se vê nas ruas e o seu amor pela vida urbana.
 



"(...) Há ruas que, pouco honestas no passado, acabaram tomando vergonha — a da Quitanda. Essa tinha mesmo a mania de mudar de nome. Chamou-se do Açougue Velho, do lnácio Castanheira, do Sucusarrará, do Tomé da Silva, que sei eu? Até mesmo Canto do Tabaqueiro. Acabou Quitanda do Marisco, mas, como certos indivíduos que organizam o nome conforme a posição que ocupam, cortou o marisco e ficou só Quitanda."


"Era às seis da tarde, defronte do mar. Já o sol morrera e os espaços eram pálidos e azuis. As linhas da cidade se adoçavam na claridade de opala da tarde maravilhosa. Ao longe, a bruma envolvia as fortalezas, escalava os céus, cortava o horizonte numa longa barra cor de malva e, emergindo dessa agonia de cores, mais negros ou mais vagos, os montes, o Pão de Açúcar, São Bento, o Castelo apareciam num tranqüilo esplendor."






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